Estratégias para realizar uma higienização eficiente em indústrias de cereais e pastifícios
Tão importante quanto em outros setores da cadeia da alimentação, a higienização nas indústrias de cereais e pastifícios deve prever atenção especial às particularidades destes segmentos, principalmente para evitar a contaminação cruzada.
As indústrias de massas alimentícias buscam aprimorar cada vez mais seus processos a fim de obter melhor qualidade de seus produtos. Essa qualidade dependerá das matérias-primas utilizadas na fabricação e processamento de massas e da correta aplicação das Boas Práticas de Fabricação (BPF) nas plantas produtivas.
Além disso, outro aspecto importante a ser considerado para obter esta qualidade está relacionado à higienização correta da indústria. Este fator é fundamental para a prevenção de contaminações e para que não ocorra a proliferação microbiológica.
No que diz respeito a higienização muitos são os aspectos a serem observados. Um deles é a verificação das características da área produtiva ser higienizada, pois em algumas delas a limpeza e desinfecção não podem ser realizadas com aplicação de água, ou seja, devem ser feitas à seco.
Para entender este e outros desafios que podem trazer ameaças a estas plantas produtivas, confira a seguir quais as alternativas viáveis para a criação de um programa de higienização eficiente em uma indústria de cereais e pastifícios.
Entendendo o segmento de massas
No Brasil, a legislação da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) define as massas alimentícias ou macarrão como produto não fermentado, obtido pelo amassamento da farinha de trigo, da semolina ou da sêmola de trigo com água, adicionado ou não de outras substâncias permitidas. As massas alimentícias ainda são classificadas, pela ANVISA, em três grupos:
Segundo o teor de umidade:
- Massa fresca - quando submetida a processo parcial de secagem. Este produto, devido ao seu alto teor de umidade próximo a 30%, requer cuidados especiais para sua preservação.
- Massa seca - quando submetida a processo de secagem.
Segundo o formato:
- Massa comprida ou longa - massa tipo espaguete, talharim e outras.
- Massa curta - massa tipo ave-maria, concha e outras.
- Massinha - massa tipo chumbinho, alfabeto, alpiste, estrelinha e outras.
Segundo a composição:
- Massa mista - preparada pela mistura de farinha de trigo com outras farinhas.
- Massa recheada - recheio preparado com diferentes substâncias alimentícias aprovadas.
- Massa glutinada e super ou hiper glutinada - preparada com farinha de trigo e glúten.
Umidade e Atividade da Água como características para qualidade do alimento
A Anvisa diferencia as massas pelo seu teor de umidade. Por isso, é preciso estar ciente em relação a água em dois importantes parâmetros que impactam no processo de higienização: a atividade de água e a umidade relativa do ambiente.
Os parâmetros de atividade de água (Aw) e umidade (UR) geralmente podem ser confundidos entre si. A atividade de água é uma característica intrínseca do alimento - os valores variam entre zero a um - e está inteiramente relacionada com as propriedades físico-químicas do alimento, caracterizando uma medida qualitativa. Sendo assim, a Aw é a quantidade de água livre presente nos alimentos, ou seja, o quanto de água disponível para ser utilizada por microrganismos ou reações enzimáticas.
Já a umidade é um parâmetro extrínseco, indicativo da quantidade de água total no alimento. A umidade relativa do ar tem efeito sobre a atividade de água, pois o alimento ao ser acondicionado em ambientes com alta umidade terá sua Aw aumentada. Consequentemente, além do cuidado com o alimento é preciso controlar os fatores externos que podem afetar a qualidade do produto.
Principais microrganismos e faixas de desenvolvimento
As bactérias são normalmente mais exigentes quanto à disponibilidade de água livre, seguidas pelos bolores e leveduras, sendo que, dentre estes últimos, algumas espécies se destacam pela tolerância a ambientes ou alimentos com baixa Aw. Entretanto, teores de Aw abaixo de 0,60 inviabilizam o desenvolvimento microbiano, reduzindo as possibilidades de alterações nos alimentos. É importante ressaltar que uma Aw baixa não significa a destruição dos microrganismos, mas sim a inviabilidade de se manter como células viáveis. Alguns microrganismos nestas condições passam à forma de células injuriadas, enquanto outros passam à forma esporulada.
Níveis mínimos aproximados de atividade de água que permitem crescimento de microrganismos
Os alimentos podem ter Aw de 0,1 a 0,99, mas há exemplos com Aw de 0,10 a 0,20 como açúcar, leite em pó e biscoitos. Alimentos com Aw menores, com 0,60 são mel, nozes, massas (macarrão) e os chocolates. Já os alimentos com Aw de 0,60 a 0,85 são as geleias, queijo parmesão e frutas desidratadas. As carnes curadas e leite condensado apresentam Aw de 0,85 e 0,93. Na faixa de 0,93 a 0,99 há os sucos de frutas, molhos de tomate, carnes frescas, frutas, vegetais e leite.
Desafios para a higienização tradicional
A maior dificuldade na higienização de pastifícios está no controle da utilização da água dentro das plantas. É preciso atenção, como já descrito, tanto no teor de umidade quanto à atividade de água promovida nos resíduos aderidos nos equipamentos, superfícies e instalações, em razão das características dos insumos, como farinhas, pós, entre outros.
Não significa, no entanto, que não se possa higienizar o ambiente diariamente pelo método tradicional, mas que, caso seja feito, é preciso secar muito bem as instalações quando há uso intensivo de água. Na prática, os recursos gastos para se enxugar o ambiente seriam infinitamente superiores aos de se adotar um procedimento à seco, tanto no tocante ao procedimento em si quanto em relação ao controle da UR e Aw.
A favor da escolha dos métodos à seco também pesa o fato de que, por mais que se tenha nutrientes em abundância nas instalações, a escassez de água inviabiliza o desenvolvimento de microrganismos. Isso ocorre tanto para os patogênicos quanto os deteriorantes, que podem reduzir a qualidade do alimento produzido, tornando-o impróprio para o consumo humano ou animal. Essa deterioração pode ser observada por alterações de odor, cor, aspecto, sabor e textura nos alimentos produzidos. A partir destas informações, apresentamos a seguir um programa básico de higienização para plantas de pastifícios.
Procedimento para higienização das instalações
Levando-se em conta as características das matérias-primas e suas particularidades em relação à umidade, deve-se optar por processos de limpeza à seco nos ambientes, seja através de varredura ou emprego de aspiradores de pó. O ideal é evitar a utilização de ar comprimido, para não causar a contaminação cruzada que pode ocorrer entre os ambientes produtivos. No caso de resíduos mais aderidos, que não são facilmente removidos por meios à seco, é possível empregar soluções alcoólicas ou de detergentes sem enxágue para sua remoção. Neste sentido, detergentes enzimáticos especialmente desenvolvidos para este fim são uma das principais soluções disponíveis para a higienização. O importante é reduzir ao mínimo o uso de água nestes ambientes. Já para a sanitização dos ambientes, os desinfetantes aerossóis são o que há de mais avançado no mercado. O produto Dynamic Air Spray é uma das soluções inovadoras encontradas hoje no mercado, pois não precisa utilizar água para sua aplicação. Outra vantagem é seu alto poder fungicida, virucida e bactericida que o torna a solução ideal para o controle microbiológico das instalações.
Semanalmente ou quinzenalmente, dependendo do fluxo de trabalho e do tipo de processo, é preciso proceder com uma higienização úmida dos pisos da área de processamento, nos moldes padrões de trabalho, ou seja, pré-lavagem, lavagem, enxágue e sanitização. É importante ter sempre o cuidado de garantir um ambiente o mais seco possível ao final da higienização. Quando necessário, também deve-se fazer a higienização tradicional no teto, paredes e esquadrias.
Higienização de equipamentos
Raspagem e Pré-Lavagem: deve-se efetuar raspagem com espátula, a fim de remover os resíduos mais grosseiros durante o intervalo do processo produtivo. É uma operação importante, pensada para que não restem muitos refugos secos no final da operação, o que dificultaria bastante a higienização. A sujidade mais difícil pode ser removida através de enxágue com água quente quando o processo ficar parado por um tempo mais longo, mas deve-se garantir que os equipamentos estejam completamente secos antes do reinício dos trabalhos.
Lavagem: é indicado desmontar os equipamentos, na medida do possível, e aplicar solução detergente, respeitando os parâmetros estabelecidos, como concentração, tempo de contato e temperatura. A aplicação da solução detergente pode ser manual, por imersão, por sistema CIP ou COP. Nos casos de limpeza manual ou por imersão, deve-se exercer ação mecânica após os tempos de contato preconizados. Em seguida, proceder com o enxágue final, certificando-se de não restarem quaisquer resíduos nos equipamentos e superfícies.
Sanitização: após o enxágue final, é necessário aplicar o desinfetante escolhido para sanitização, na dosagem recomendada e aguardando o tempo de contato mínimo exigido para a sua eficácia. Após a utilização da solução desinfetante é preciso fazer o enxágue final para remoção do sanitizante das superfícies onde haverá manipulação de alimentos. Garanta sempre que tudo esteja completamente seco antes de iniciar o processo produtivo. No caso da utilização de solução alcoólica para sanitização, não é necessário o enxágue final, já que o álcool é volátil e promove a secagem das superfícies.
Prevenção da contaminação cruzada
Um dos principais aspectos a se considerar na higienização é a prevenção da contaminação cruzada. Esse termo é utilizado para expressar a ação de transferir microrganismos de um alimento ou ambiente contaminado para outros alimentos ou ambientes, através de utensílios, móveis, equipamentos, manipuladores ou quaisquer objetos ou superfícies. Este cuidado é de suma importância dentro de um pastifício, considerando a natureza dos insumos e matérias-primas utilizadas no processo produtivo. A fim de diminuir ou evitar a contaminação cruzada, é importante mitigar as ações de contrafluxo na produção, carreamento de microrganismos de áreas sujas para áreas limpas ou de higienização de linhas em paralelo a linhas de produção.
Vale ressaltar que os procedimentos de higienização não visam somente melhorar o controle microbiológico da unidade em si, mas também melhorar a qualidade dos alimentos produzidos na unidade. Um programa de higienização bem concebido e implementado de forma global traz inúmeros benefícios, não somente em relação a custos, mas também na qualidade final do produto.
Assim como a higienização mantem o controle microbiológico do ambiente, confira como os biofilmes bacterianos podem impactar a produção na indústria de alimentos.
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Diego Todescato - Doutor em Engenharia Química
Veja mais posts do autorLeandro Mion - Técnico em Bioquímica e Consultor Técnico de Vendas da BTA Aditivos.
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